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Entenda a urgência e a demora para entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza

Mais de 100 caminhões enviados por vários países e organizações de caridade com milhares de toneladas de mantimentos aguardam a abertura da passagem de Rafah, na fronteira entre o Egito e o sul da Faixa de Gaza, em meio a negociações entre autoridades israelenses, americanas e egípcias.

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Faz dez dias que apenas alguns poucos quilômetros separam dezenas de caminhões de ajuda humanitária dos milhares de palestinos que, confinados na Faixa de Gaza, precisam de comida, água e remédios.

Mais de 100 caminhões enviados por vários países e organizações de caridade com milhares de toneladas de mantimentos aguardam a abertura da passagem de Rafah, na fronteira entre o Egito e o sul da Faixa de Gaza, em meio a negociações entre autoridades israelenses, americanas e egípcias.

As tratativas culminaram em um acordo entre o Egito e Israel que permitirá que os primeiros 20 caminhões passem por Rafah nesta sexta-feira (20).

Após o ataque massivo do grupo terrorista Hamas contra Israel no último dia 7, que matou centenas de pessoas, o país impôs um bloqueio total ao território palestino, interrompendo a entrada de água, comida, combustível e eletricidade. Desde então, a situação para os mais de 2,3 milhões de palestinos que vivem em Gaza vem se deteriorando rapidamente.

“O direito humanitário internacional é muito claro: você não pode fazer uma população inteira passar fome. Você não pode usar ajuda, comida ou água como um instrumento de guerra para qualquer fim político ou militar”, afirmou Marwan Jilani, diretor geral da organização Crescente Vermelho para a Palestina (como é chamada a Cruz Vermelha em países islâmicos), à emissora Al Jazeera.

Para a Organização das Nações Unidas (ONU), o cenário é desastroso: não há eletricidade desde o dia 11, a insegurança alimentar só aumenta e o sistema de saúde está à beira do colapso.

Agências da ONU já alertaram que o território só tem comida para menos de uma semana e que a usina de dessalinização de água de Gaza foi desligada, aumentando o risco de mais mortes por falta de água, desidratação e doenças por ingestão de água contaminada.

Após a explosão de um hospital na Cidade de Gaza, ao norte do território palestino, e os bombardeios contínuos por parte de Israel, protestos eclodiram em várias partes do Oriente Médio. No âmbito internacional, há, ainda, uma grande preocupação de que a guerra escale e se torne um conflito regional mais amplo.

Nesta quarta-feira (18), o primeiro-ministro de Israel Benjamin Netanyahu afirmou que seu país não vai impedir a entrada de alimentos, remédios e água a partir do Egito, desde que os suprimentos sejam destinados aos civis palestinos e não cheguem a militantes do Hamas. Não houve menção a combustível, considerado essencial para que os geradores dos hospitais do território continuem funcionando.

Também na quarta, o presidente dos Estados Unidos Joe Biden disse que o Egito concordou em abrir a fronteira em Rafah para a passagem inicial de 20 caminhões. A expectativa é que os caminhões possam entrar a partir desta sexta-feira (20).

O canal estatal do Egito informou nesta quinta-feira (19) que a passagem será aberta na sexta (20). O horário de abertura não foi especificado.

Entenda, abaixo, os entraves – práticos e políticos – que vem dificultando a entrada urgente de ajuda humanitária:

O que é a passagem de Rafah

Os postos de controle conhecidos como passagem de Rafah são o único lugar em que é possível cruzar do Egito para a Faixa de Gaza, ou ao contrário, e ficam localizados na cerca de quase 13 km que separa o território palestino da península do Sinai.

A passagem é a única que não é controlada por Israel. O país já mantinha a Faixa de Gaza bloqueada antes da guerra. São quase 17 anos de controle por ar, terra e mar imposto contra o território, mantendo a Faixa de Gaza praticamente isolada do resto do mundo.

O bloqueio total em resposta ao ataque do Hamas piorou a situação. Mais de 1 milhão de palestinos deixaram suas casas no norte do território palestino após as ordens de evacuação de Israel.

Rafah, cidade fronteiriça ao sul, se tornou a única esperança para quem tenta deixar Gaza. É lá que estão milhares de palestinos e centenas de estrangeiros, incluindo os brasileiros que o governo brasileiro tenta resgatar.

Ajuda humanitária se acumulando

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Uma enorme fila de mais de 100 caminhões aguarda do lado egípcio para poder cruzar para dentro de Gaza com 3.000 toneladas de mantimentos.

“Nós temos ajuda suficiente para um longo período de tempo”, disse à DW um funcionário de uma organização humanitária que está em Rafah. “Temos comida, laticínios, vegetais, remédios”.

Há ainda mais ajuda no aeroporto El Arish, na costa nordeste do Egito, próximo a passagem. Segundo o New York Times, a União Europeia (UE) contratou um avião de carga que chegou ao aeroporto na terça-feira. Outro avião de ajuda humanitária financiado pela UE estava previsto para esta quinta-feira (19).

Preocupação israelense com o Hamas

Ainda de acordo com o New York Times, Israel vem insistindo que todos os caminhões sejam verificados para garantir que a carga seja apenas de ajuda humanitária. O país também quer evitar que os mantimentos cheguem ao Hamas.

Na quarta-feira (18), em um comunicado divulgado pelo gabinete do primeiro-ministro israelense, Israel afirmou que após a demanda de Biden, o país não vai impedir a entrada de suprimentos via Egito.

“Israel não vai permitir qualquer ajuda humanitária enviada do seu território para a Faixa de Gaza enquanto os nossos reféns não retornarem”, diz o comunicado em referência as quase 200 pessoas mantidas presas pelo Hamas.

Apreensão do Egito

O Egito vem sendo pressionado pelos Estados Unidos e outros países, incluindo o Brasil, para abrir a fronteira para a entrada de ajuda humanitária e saída de estrangeiros de Gaza. O país, por sua vez, também tem feito pressão para que Israel permita o envio de auxílio, mas teme que os bombardeios israelenses possam atingir os comboios de ajuda.

De acordo com o New York Times, funcionários dos EUA e da União Europeia disseram que as autoridades egípcias não têm permitido que seus diplomatas acessem a área no entorno da passagem de Rafah, nem para inspecionar a ajuda enviada pelos governos. O jornal afirma que a falta de acesso reflete o desejo do Egito de manter o controle da região, na qual o país vem lutando contra militantes por anos.

Ao longo dos últimos dias, autoridades do Egito também expressaram preocupação com um eventual fluxo de refugiados palestinos.

“O que está acontecendo agora em Gaza é uma tentativa de forçar os residentes civis a se refugiarem e migrarem para o Egito, o que não deve ser aceito”, afirmou o presidente do país, Abdel Fattah al-Sisi, nesta quarta-feira (18).

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“O Egito rejeita qualquer tentativa de resolver a questão palestina por meios militares ou por meio do deslocamento forçado dos palestinos de sua terra, o que viria às custas dos países da região”, disse ele.

Segundo a ONU, o Egito, que está enfrentando uma crise econômica e tem por volta de 110 milhões de habitantes, já abriga cerca de 9 milhões de refugiados e migrantes, incluindo quase 300 mil pessoas que chegaram neste ano do Sudão, fugindo da guerra no país.

Veto americano à resolução brasileira no Conselho de Segurança da ONU

Nesta quarta-feira (18), os Estados Unidos foram o único país a vetar uma resolução proposta pelo Brasil no Conselho de Segurança da ONU que incluía, entre outros pontos, o estabelecimento de um corredor de ajuda humanitária na Faixa de Gaza.

Atual presidente rotativo do Conselho de Segurança, o Brasil havia elaborado uma resolução que seria a primeira manifestação formal do órgão sobre o conflito. Doze países votaram a favor do texto, Rússia e Reino Unido se abstiveram e apenas os EUA votaram contra.

Como os Estados Unidos são um dos cinco países com assento permanente no Conselho e, portanto, poder de veto, o texto foi integralmente rejeitado. Não há prazo para elaboração de uma nova versão.

Após a votação, a embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Linda Thomas-Greenfield, argumentou que seu país ficou "desapontado" pelo fato de o texto não mencionar o direito de autodefesa de Israel.

Bombardeios contínuos e estradas destruídas

Autoridades egípcias afirmam que a passagem de Rafah ficou quase inoperante por causa dos contínuos ataques aéreos de Israel.

As estradas próximas à passagem estão repletas de buracos causados pelos bombardeios, que precisam ser reparados para possibilitar a passagem dos caminhões.

O presidente dos EUA Joe Biden afirmou que os reparos poderiam levar cerca de oito horas para que as primeiras entregas de ajuda possam acontecer nesta sexta-feira (20), segundo informações da CNN dos Estados Unidos.

Máquinas para reparar estradas foram enviadas, através da fronteira de Rafah, com o objetivo de preparar a passagem, informaram à Reuters fontes de segurança nesta quinta-feira (19).

De acordo com a agência de notícias palestinas WAFA, nesta quinta-feira (19) ao menos 30 pessoas foram mortas por bombardeios em várias áreas da cidade de Rafah, um indicativo das dificuldades e perigos de enviar ajuda pela região.

Também nesta quinta (19), um bombardeio atingiu a cidade de Khan Younis, a menos de 10 km de Rafah. Funcionários da ONU estão entre os feridos.

Há dias, Israel informou aos palestinos que eles deviam deixar o norte da Faixa de Gaza, fazendo com que centenas de milhares de pessoas se deslocassem para o sul, descrito por Israel como uma “zona segura” para civis, segundo a Associated Press.

O brasileiro Hasan Rabee, uma das milhares de pessoas que aguardam em Khan Younis a abertura da fronteira com o Egito, disse que "não existe lugar seguro" no território palestino.

Fonte: g1

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